sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

Portugal e o futuro

Portugal e o futuro

António de Spínola

Editora Nova Fronteira

Rio de Janeiro

1974

Tombo: 53 

 

Portugal e o futuro: análise da conjuntura nacional, de Antônio de Spínola, é um livro histórico, pois sua publicação, que alcançou a venda de 50.000 exemplares em um único dia, provocou a guinada na História de Portugal com a Revolução dos Cravos. Na obra, o general licenciado analisa a conjuntura de Portugal no início dos anos 1970 sob diferentes aspectos e propõe uma reforma que quer o país transformado em uma grande nação além das fronteiras europeias, integrando os países africanos de língua portuguesa com importante papel para o Brasil: a Comunidade Lusíada (Estado da Lusitânia ou República Federativa Portuguesa) com toda população exercendo seus direitos de cidadão português. A Comunidade Lusíada seria um país pluricontinental, pluricultural e plurinacional, uma federação com descontinuidade territorial e heterogeneidade, incluindo autonomia político-administrativa para cada região com leis adequadas a cada território por sua tradição e cultura, mantendo respeito às leis básicas da federação. Trabalha com interesse sobre Direito Internacional, História e conceitos de Teoria de Estado. Ensinava que “o convívio de raças só conduzirá a resultados objetivos se for acompanhado de uma equitativa repartição de oportunidades de acesso aos lugares de mando político-administrativo”.

Na vanguarda, o autor já analisava a globalização, “a complexa teia da repartição mundial de recursos e mercados”, a que chamou de planetarização e que inclusive implicava na “internacionalização dos problemas internos”. Analisa com conhecimento de proximidade a experiência da “belle amitié” em Katanga (região do ex-Congo Belga). Assim, o autor analisa com profundidade: i) a questão africana; ii) as políticas de descolonização da ONU; iii) o Eurocentrismo; iv) a influência da URSS na África; v) a corrente anti-portuguesa; vi) o orientalismo português; e vii) o fim da Índia portuguesa.

Expõem com franqueza opiniões e observações, que merecem registro:

“há uma diferença entre o que as massas aplaudem e o que cada cidadão sente na sua secreta intimidade” p. 105.

“Se por portugueses de hoje entendermos todos os que por lei são cidadãos a sua esmagadora maioria é africana” p. 106.

“Só preservaremos essa portugalidade se por portugueses considerarmos de fato e de direito todos os africanos e europeus” p.107.

“O ultramar tem que ser parte integrante da nação” p. 123.

“Os grandes interesses se defendem por si mesmos” p.123.

“Somos conduzidos a rejeição da tese integracionista simples sob um poder centralizado e concentrado”. p 129.

“Nunca a política de um governo pode ser autêntica se não se orientar pelos anseios dos governados” p. 130.

“O problema reside, assim, em promover a autodeterminação das populações ultramarinas pela sua integração na República portuguesa” p 144.

“É na decisão a uma comunidade lusíada que está o caminho do seu progresso e da sua verdadeira Independência face ao neocolonialismo que avanssala os seus vizinhos africanos” p. 145.

“Não pode encarar se se não como criminosa demissão, toda a orientação que vise a substituição pura e simples das atuais estruturas institucionais pela dos partidos revolucionários, que não representam as populações africanas nem os seus legítimos interesses. Seria criminoso e fundamentalmente anti-português abandonar a sua sorte esses milhares de europeus e milhões de africanos que em nós confiam. Mas também seria criminoso e francamente anti-português caminhar para esse abandono pela via do imobilismo, imputando todos os nossos males à cobiça alheia” pp 146-147.

“Queremos sem dúvida do Minho a Timor uma pátria de pátrias e uma pátria comum” p. 167.

“Por que nação e pátria muito mais do que criação de um estatuto legal são sentimento e vivência no subconsciente de cada homem” p.227.

Uma obra que mesmo meio século depois ainda ensina importantes lições: em exercício de futurologia desde 1974, que, lido quase 50 anos depois, revela acertos e caminhos que a Revolução não quis tomar.


Nenhum comentário:

Postar um comentário