Portugal
e o futuro
António de Spínola
Editora Nova Fronteira
Rio de Janeiro
1974
Tombo: 53
Portugal
e o futuro: análise da conjuntura nacional, de Antônio de Spínola,
é um livro histórico, pois sua publicação, que alcançou a venda de 50.000
exemplares em um único dia, provocou a guinada na História de Portugal com a
Revolução dos Cravos. Na obra, o general licenciado analisa a conjuntura de
Portugal no início dos anos 1970 sob diferentes aspectos e propõe uma reforma
que quer o país transformado em uma grande nação além das fronteiras europeias,
integrando os países africanos de língua portuguesa com importante papel para o
Brasil: a Comunidade Lusíada (Estado da Lusitânia ou República
Federativa Portuguesa) com toda população exercendo seus direitos de cidadão
português. A Comunidade Lusíada seria um país pluricontinental, pluricultural e
plurinacional, uma federação com descontinuidade territorial e heterogeneidade,
incluindo autonomia político-administrativa para cada região com leis adequadas
a cada território por sua tradição e cultura, mantendo respeito às leis básicas
da federação. Trabalha com interesse sobre Direito Internacional, História e conceitos
de Teoria de Estado. Ensinava que “o convívio de raças só conduzirá a
resultados objetivos se for acompanhado de uma equitativa repartição de
oportunidades de acesso aos lugares de mando político-administrativo”.
Na
vanguarda, o autor já analisava a globalização, “a complexa teia da
repartição mundial de recursos e mercados”, a que chamou de planetarização
e que inclusive implicava na “internacionalização dos problemas internos”.
Analisa com conhecimento de proximidade a experiência da “belle amitié” em
Katanga (região do ex-Congo Belga). Assim, o autor analisa com profundidade: i)
a questão africana; ii) as políticas de descolonização da ONU; iii) o
Eurocentrismo; iv) a influência da URSS na África; v) a corrente anti-portuguesa;
vi) o orientalismo português; e vii) o fim da Índia portuguesa.
Expõem
com franqueza opiniões e observações, que merecem registro:
“há
uma diferença entre o que as massas aplaudem e o que cada cidadão sente na sua
secreta intimidade” p. 105.
“Se
por portugueses de hoje entendermos todos os que por lei são cidadãos a sua
esmagadora maioria é africana” p. 106.
“Só
preservaremos essa portugalidade se por portugueses considerarmos de fato e de
direito todos os africanos e europeus” p.107.
“O
ultramar tem que ser parte integrante da nação” p. 123.
“Os
grandes interesses se defendem por si mesmos” p.123.
“Somos
conduzidos a rejeição da tese integracionista simples sob um poder centralizado
e concentrado”. p 129.
“Nunca
a política de um governo pode ser autêntica se não se orientar pelos anseios
dos governados” p. 130.
“O
problema reside, assim, em promover a autodeterminação das populações ultramarinas
pela sua integração na República portuguesa” p 144.
“É na
decisão a uma comunidade lusíada que está o caminho do seu progresso e da sua
verdadeira Independência face ao neocolonialismo que avanssala os seus vizinhos
africanos” p. 145.
“Não
pode encarar se se não como criminosa demissão, toda a orientação que vise a
substituição pura e simples das atuais estruturas institucionais pela dos
partidos revolucionários, que não representam as populações africanas nem os
seus legítimos interesses. Seria criminoso e fundamentalmente anti-português
abandonar a sua sorte esses milhares de europeus e milhões de africanos que em
nós confiam. Mas também seria criminoso e francamente anti-português caminhar
para esse abandono pela via do imobilismo, imputando todos os nossos males à
cobiça alheia” pp 146-147.
“Queremos
sem dúvida do Minho a Timor uma pátria de pátrias e uma pátria comum” p. 167.
“Por
que nação e pátria muito mais do que criação de um estatuto legal são
sentimento e vivência no subconsciente de cada homem” p.227.
Uma
obra que mesmo meio século depois ainda ensina importantes lições: em exercício
de futurologia desde 1974, que, lido quase 50 anos depois, revela acertos e
caminhos que a Revolução não quis tomar.